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Sobre a greve dos caminhoneiros


O movimento grevista dos caminhoneiros que já dura seis dias colocou boa parte do Brasil, incluindo seus principais centros urbanos, de cabeça para baixo. Na cidade de São Paulo foi decretado estado de emergência, dada a falta de combustíveis para alimentar serviços públicos essenciais; além disso, o prefeito conseguiu uma liminar na justiça autorizando o uso das forças da Polícia Militar para liberar as rodovias e reprimir os grevistas, coisa que ainda não aconteceu. Neste mesmo sentido, Michel Temer fez uma declaração em rede nacional, nesta sexta-feira, afirmando que autorizaria o uso das polícias rodoviárias federais e mesmo das Forças Armadas para reprimir o movimento, recomendando que os governos estaduais também empreendam seus “esforços”. A grande mídia burguesa-latifundiária, monopolista e subserviente ao imperialismo, também começa a emitir seus posicionamentos mais contundentes: nesta manhã, tanto a Folha de São Paulo, Estadão e o Globo fizeram manifestações em seus editorais denunciando e atacando virulentamente o “radicalismo”, a “intransigência” e a “chantagem” dos caminhoneiros (ou de uma “minoria agitadora”, como cinicamente estes ideólogos precisam repetir), que não arrefeceram suas mobilizações mesmo após acordo supostamente vantajoso com o governo federal na noite de ontem.

Neste cenário, sem dúvida complexo e multifacetado, além de não totalmente definido, o movimento popular e democrático brasileiro, chamado genericamente de “esquerda”, se dividiu em torno das opiniões sobre a greve dos caminheiros. Enquanto uns apontaram o perigo ou mesmo o fato de se tratar de um locaute, quando trabalhadores entram em greve para atender os interesses do patronato; outros afirmaram que se tratava de uma movimentação popular espontânea e legítima, que deveria ser apoiada, disputada e dirigida por organizações revolucionárias. Assim, buscaremos traçar algumas soluções para estes impasses, de modo a apontar perspectivas de ações conscientes e revolucionárias diante deste movimento.

Primeiramente, é válido apontar que a cautela, nas condições conjunturais em que vivemos, nunca é demais. É sabido que o inimigo é poderoso, e que em caso de agravamento da crise, tem cartas e planos em suas mangas, podendo fazer a situação piorar ainda mais. Este é um fato e ele está colocado para todos. Assim, dado ao conhecido aparelhamento e controle das classes dominantes sobre a categoria dos caminhoneiros; sua influência ideológica sobre a mesma; somado às características próprias desta e que fragilizam sua organização, como sua precarização e caráter de trabalho itinerante; por conta de tudo isso, é compreensível e até importante que se tenha cautela e se faça uma análise consequente sobre este movimento. Não obstante, é importante apontarmos que este cuidado, neste sentido, não pode ser confundida com a posição elitista, infantil e essencialmente reacionária de naturalizar a categoria dos caminheiros como “reacionários em si”, e que chega ao trágico absurdo quando pessoas supostamente “de esquerda” (com todas as aspas possíveis) ridicularizam estes trabalhadores e manda-os “bater panela” ou qualquer coisa do tipo, tentando provar alguma superioridade intelectual imaginária com um sorriso amarelo no rosto.

Feitas estas considerações iniciais, é importante analisarmos os fatos. O movimento dos caminheiros deste ano começou com o pedido de negociação com o governo federal, feito no dia 15 de maio, sobre os preços do diesel e o fim da cobrança de pedágios sobre eixos suspensos. Como o governo se negou a negociar, diversas entidades sindicais e associações da categoria indicaram paralisações a partir do dia 21 de maio, que foram realizadas e permanecem acontecendo até hoje. Durante estes dias de paralisação, a adesão espontânea e organizada (de diversas formas) apenas aumentou. O movimento colocou-se em condições de negociar e o governo federal cedeu em uma série de pautas, em reunião realizada nesta quinta-feira, incluindo a redução em 10% do preço do óleo diesel e quedas nas alíquotas de impostos sobre o mesmo. Contudo, algumas entidades sindicais e algumas faixas da base da categoria rejeitaram o acordo e afirmaram que manterão as paralisações, até conseguirem todas as suas pautas.

Neste ponto, é importante precisarmos um pouco sobre a categoria, suas entidades e associações sindicais e as pautas que estão reivindicando. O movimento, em geral, está sendo puxado e encabeçado pelos caminhoneiros autônomos, que são cerca de 70% dos caminhoneiros do país. Dentre estes, a maioria possui apenas um veículo e uma minoria possuem dois ou três veículos, que alugam para outros motoristas. Também apontamos que os pequenos proprietários, donos de um ou dois veículos, encontram-se em processo acelerado de proletarização, já que o endividamento destes em bancos cresce exponencialmente. Os caminhoneiros assalariados, cerca de 30% da categoria, empregados por grandes transportadoras e empresas de logística, também compuseram as paralisações, muitas vezes com o apoio do patronato, que possui pautas convergentes com o movimento, especialmente a redução dos impostos.

Dada esta composição da categoria – não totalmente proletarizada e com setores assalariados de difícil concentração e organização, dado o caráter itinerante de seu trabalho –, mas também por conta de sua enorme centralidade para a valorização do capital em nosso país, existem enormes contradições dentro do movimento, que se expressam em uma variedade de pautas e bandeiras que podem confundir facilmente quem se orienta apenas pela aparência dos fenômenos. Assim, os caminhoneiros protestam tanto por pautas de interesse mais direto do patronato, como zerar a incidência de impostos como o ICMS e o PIS-Cofins sobre o diesel, quanto por pautas de interesse francamente popular, como pela mudança da política de preços imposta por Michel Temer e Pedro Parente na Petrobras e o aumento do preço dos fretes.

É fato que as classes dominantes têm consciência da importância dos trabalhadores do transporte rodoviário em nosso país e há tempos se esforçam para aparelha-los e dominá-los ideologicamente. Entretanto, este esforço nunca poderá ser totalmente bem-sucedido e o aparelhamento e o controle ideológico nunca serão absolutos, pelo simples motivo que, objetivamente, os trabalhadores e as classes dominantes possuem interesses eminentemente contraditórios e antagônicos. Concretamente, isso significa que setores dos caminhoneiros buscam escapar, de modo inicialmente espontâneo, da influência patronal que paira sobre o movimento.

Conforme o movimento de greve se estende e se desenvolve, suas contradições internas se acirram e a influência patronal é posta contra a parede. É o que parecem apontar os últimos fatos, quando algumas entidades sindicais dos caminhoneiros aceitaram o acordo do governo – uma vez que ele já garantia a pauta patronal do subsídio estatal sobre o preço do diesel – ao passo que a base do movimento de modo geral rejeita o acordo e quer permanecer mobilizada. Assim, os rachas e contradições explícitas entre a categoria se acumulam e se aprofundam; e as classes dominantes começam a suar frio diante da crescente revolta popular.

Neste cenário de acirramento das contradições, é impossível afirmar que o movimento não seja uma greve – inclusive com manifestações e pautas não apenas legítimas, como também politicamente avançadas, na medida em que confrontam abertamente uma política do governo golpista e não se limita a reivindicar ganhos econômicos específicos da categoria –, e é extremamente precipitado reduzi-lo a um locaute. Não porque não existem forças patronais se esforçando para que assim seja, mas simplesmente porque o movimento possui frações, rachas, contradições e fissuras que deixam a direção de seu desenvolvimento em aberto. E ao que tudo indica, conforme os dias passam e as contradições se acirram, as frações progressistas que congregam revoltas e reivindicações autenticamente populares destes trabalhadores, ganham ímpeto e força.

Dentre estas pautas populares, que devem ser incentivadas e defendidas pelos comunistas e demais progressistas e democratas de nosso país, está a mudança da política de preços de combustíveis adotada pela Petrobras na gestão de Pedro Parente, indicado por Michel Temer para a presidência da companhia. Esta política consiste em alterar o controle estatal sobre os preços e substituir pura e simplesmente pela correção de acordo com as flutuações das cotações do petróleo e do dólar no mercado. Esta política não apenas fez disparar os preços dos combustíveis de modo geral em um ritmo recorde, como também acelera o desmonte da Petrobras ao incentivar a importação massiva de derivados de refinarias estrangeiras, deixando ociosas e precarizando nossas refinarias estatais. Neste sentido, Pedro Parente já negocia a venda de Refinarias da Petrobras para o capital estrangeiro, o que acarretará um aprofundamento ainda maior de nossa dependência neste setor em relação aos países imperialistas. Portanto, não é de causar surpresa que esta política de preços coincida com o aumento expressivo da importação de combustível de refinarias norte-americanas, que no ano passado se tornou o item que o Brasil mais comprou deste país.

Esta política, bem como toda a gestão de Pedro Parente na Petrobras deve ser denunciada como causa da atual crise nos preços dos combustíveis e seu cancelamento deve ser incentivado como pauta dentro do movimento grevista dos caminhoneiros. Com isso, deve-se suprimir a possibilidade de utilizar deste movimento para incentivar e acelerar o desmonte e entrega da Petrobras. Neste sentido, a mobilização dos petroleiros, que também estão prestes a entrar em greve em defesa da Petrobras, poderá assumir um papel importante em auxiliar e fortalecer ideologicamente o movimento dos caminhoneiros. As muitas declarações de solidariedade prestadas por sindicatos dos petroleiros apontam para esta direção.

E um último ponto que devemos considerar nesta conjuntura, é a fraqueza do governo Temer diante deste do aumento das greves pelo país e desta greve em específico, além do fracasso retumbante de sua política para amenizar a crise econômica e conter a crescente revolta popular contra o velho regime burguês-latifundiário. Entre a cruz e a espada, desagradando tanto as classes dominantes que pretende servir, quanto as massas populares, que lhe tem verdadeiro desprezo, Temer apela para as Forças Armadas mais uma vez, decretando Garantia da Lei e da Ordem em todo o território nacional na noite de hoje (25/05). Com isso, mais uma vez os militares aumentam seu poder e influência na ditadura burguesa-latifundiária brasileira. Temer entregou ao exército a responsabilidade em conter os grevistas, autorizando-os a usar a força para furar bloqueios e apreender os caminhões e mercadorias dos trabalhadores. Devemos ter a conta a crescente tendência do imperialismo e das classes dominantes locais em adotar uma saída militar-fascista para conter a revolta popular.

Por fim, aos comunistas não existe nenhuma outra tarefa que não a de encarar o duro desafio de estar junto aos grevistas e servi-los, para disputar ativamente as consciências destes trabalhadores e influenciar na medida do possível nos rumos deste movimento. Os caminhoneiros são uma categoria central em nossa sociedade e possuem um potencial revolucionário grandioso, que exige de nós o dispêndio de toda a atenção e esforços possíveis.

É preciso que apontemos, com calma e determinação, as verdadeiras causas do aumento dos preços do diesel e da degradação das condições de vida dos trabalhadores, relacionando-as com as medidas antipopulares do governo golpista em geral e a política de preços imposta por Pedro Parente na Petrobras em específico. Apenas desta forma poderemos dissipar os espectros reacionários que rondam estes trabalhadores, afastando para longe todo e qualquer disparate antinacional de intervencionismo militar e de venda da Petrobras do seio deste movimento.

Devemos confrontar estes espectros reacionários com aquele outro, que representa os interesses e visões de mundo das classes trabalhadoras, especialmente do proletariado, e que se expressa em um programa político e econômico concreto, que em nosso país atualmente passa pela defesa da Petrobras enquanto patrimônio estatal e público; pela defesa dos direitos e liberdades democráticas; pela revogação de todas as políticas anti-povo do governo golpista; pela expropriação do patrimônio monopolista do capital estrangeiro, burocrático-comprador e de todas as terras do latifúndio. Missões que exigem candentemente a reconstrução de um poderoso Partido Comunista no Brasil, capaz de dirigir as revoltas das massas populares e aponta-las para uma saída revolucionária.

VIVA AS REVOLTAS DAS MASSAS TRABALHADORAS BRASILEIRAS!

VIVA AS MOBILIZAÇÕES POPULARES DOS CAMINHONEIROS!

MORTE À VELHA SOCIEDADE E SEUS MANDANTES!

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